Rafael queria ver o mundo e saiu de casa, mas lá fora só havia um contraste de cores por demais vivas, um mundo em photoshop, tudo estava em techincolor. Consumidores alegres com suas vidas em praça de alimentações exibiam a felicidade dos cartões de crédito. A alegria fugaz possibilitada pelo conceito senso comum de ser.
Sem nada pra fazer na perfeição de um virtualismo imperativo, se resumiu a andar para o mais longe que poderia, rumo ao final da rua. Chegando lá, outra rua, e outra e mais outra, onde os passos não davam conta de finalizar o labirinto arquitetado em forma de prisão vasta e liberdade falsa. Ele queria ver o fim disso tudo, por isso andava desesperadamente, quase correndo. Tudo que lhe era possibilitado ver, já conhecia, as cores vibrantes e os consumidores alegres, as ruas sem fim, que davam em outras ruas, sem fim, e assim sucessivamente numa repetição monótona rumo ao horizonte que já não se via.
O mundo era redondo, mas se dissessem que chato e quadrado era realidade, não faria diferença, queria chegar lá, no outro lado, no fim do sonho. Por isso o andar.
Os caminhos terminavam em outros, que embocavam em outro, apenas revelando cenários conhecidos e uma possibilidade sem fim de jamais se surpreendido pela criatividade zero. O mundo era raso como os personagens dos melodramas.
Quando o sol já se punha e as pernas diminuíam o ritmo da busca, acreditou que haveria um ponto de virada. Mas não, luzes acendiam sem que se percebesse, e o mundo agora, iluminado, revelava contrastes ainda mais artificiais que os que outrora via.
Foi assim, sem mais nem menos, que deu de cara com uma rua sem saída, e se deparou com a finitude e a grade da prisão. Não havia nada além.
Derrotado, lentamente, voltava de onde tinha vindo. Com a cabeça baixa e o pensar quase inexistente, cultivava a aflição de um peixe dourado em um aquário minúsculo, cuja única função é existir parcamente para satisfazer o espetáculo inverossímil de algum imbecil.
Em casa, mais tarde, cansado pela inútil tentativa, deixava a água gelada lavar suas tristezas na esperança que o ralo comesse sua existência, queria desmanchar no relaxar mais profundo e ser derretido pela fusão com líquido que escorria de seu corpo até se confundir nas impurezas do esgoto da cidade. Isso não ocorreu.
Fatigado por sua humanidade e sentindo o peso das âncoras atadas aos pés, deixava-se afundar no infinito da imutabilidade, onde apenas era permitido um imergir sem jamais bater ao fundo.
Engolido pelos lençóis brancos de uma cama confortável, Rafael agora nem ousava pensar, apenas esperava que o sono arremessasse suas pálpebras de um peso insuportável, para que assim, amanhã, tomado de previsibilidade, pudesse vagar pelo mundo em busca de algo que não existia.
A noite progredia lentamente, lá fora, o mundo estava do mesmo de jeito que ontem e amanhã, e aos poucos de sua imersão na desesperança, tudo que podia esperar era um sono que veio.